Será que o trabalho em apenas 4 dias por semana vai funcionar no Brasil?

Teve início neste mês, no Brasil, um experimento para avaliar os potenciais benefícios de uma semana de trabalho de quatro dias. Essa iniciativa é conduzida pela 4 Day Week, uma comunidade sem fins lucrativos que realiza projetos-pilotos semelhantes ao redor do mundo, e pela organização brasileira Reconnect Happiness at Work.

Esse projeto está sendo realizado em diversos países ao redor do mundo como uma forma de integrar o trabalho a uma rotina mais saudável. No início deste mês, Portugal começou a testar esse modelo com a participação de 39 empresas e 1.000 colaboradores. Também já foi realizado nos Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e em outros países.

Minha pergunta é: Será que empresas e colaboradores estão, de fato, preparados para ter mais tempo livre e trabalhar menos? Acredito que o sonho ainda está distante de se tornar realidade para a maioria esmagadora das empresas, já que ainda possuem processos e entregas ineficientes. Isso naturalmente gera maior demanda de horas de trabalho.

Todavia, ainda há quem consiga experimentar a jornada reduzida, como a startup Eva Benefícios. Com apenas 19 funcionários, a empresa mudou para o formato 4×3 em 2022 e desde então consegue tocar projetos e realizar entregas em menos tempo.

Porém esse privilégio não é para todos. Empresas maiores com modelos mais conservadores terão mais dificuldade para eventualmente testar a semana reduzida. Uma alternativa recomendada é que isso seja feito em uma célula isolada, dentro de uma situação mais controlada, para avaliar antes de implementar a todos.

Saúde integral e qualidade de vida

Um dos pontos amplamente levantados é a priorização integral da saúde – e como trabalhar quatro dias pode ajudar nisso. Porém aí também mora um perigo escondido.

Existem, sim, estudos que mostram que funcionários ficam menos estressados e menos esgotados por conta da jornada reduzida e do foco na qualidade de vida. A neurociência também aponta a relação que há entre bem-estar e produtividade.

Por outro lado, o perigo escondido é que, para que a redução da jornada de trabalho aumente a produção, é necessário revisar os processos e a rotina de trabalho dentro do novo horário. Caso contrário, é provável que ter menos tempo para realizar as tarefas aumente o estresse e diminua a entrega.

Outro argumento muito forte em países europeus que tiveram empresas adotando o modelo de quatro dias é que há um impacto positivo no meio ambiente, pois menos dias de trabalho resultam em menos pessoas utilizando carros e transportes públicos que geram poluição.

Apesar de ser atraente, esse aspecto ambiental é inconclusivo e gera outras dúvidas, pois não podemos mapear ou acompanhar os hábitos dos funcionários durante a folga. Muitos trabalhadores utilizam seus veículos para fazer renda extra em dias que não trabalham. Talvez um dia a mais livre na semana seja um dia a mais para sair passear, ir ao mercado, enfim, utilizar meios de transporte de qualquer forma.

Entre tantas dúvidas e discussões, precisamos acompanhar os testes que estão sendo feitos no Brasil para conhecer, de fato, na prática, os detalhes do funcionamento do novo modelo. No cenário geral, onde ainda se discute trabalho híbrido e o remoto, o sonho de ter uma semana reduzida está longe de se tornar realidade.

*João Roncati é diretor da People + Strategy, consultoria de estratégia, planejamento e desenvolvimento humano. Mais informações no site http://www.peoplestrategy.com.br/