O Brasil tem enfrentado um problema grave no que se refere à formação de jovens para o mercado de trabalho. A pesquisa “Futuro do Mundo do Trabalho para as Juventudes Brasileiras”, da Fundação Roberto Marinho e Itaú Educação e Trabalho, apurou que cerca de 27% dos jovens de 14 a 29 anos fazem parte da população “nem-nem”. Ou seja, o grupo das pessoas que nem trabalham nem estudam. Esses dados trazem à tona questões sobre a falta de interesse nos estudos, um dos principais fatores para o abandono escolar.
A Geração Z, composta por jovens altamente conectados, é muitas vezes considerada digitalmente fluente devido à presença constante em redes sociais como TikTok e Instagram. Mas isso não é uma realidade, em muitos casos essa fluência não se traduz diretamente em habilidades que o mercado de trabalho digital exige, como editores de texto, planilhas ou softwares de comunicação corporativa.
Como atuo como consultor de grandes organizações, tenho escutado reclamações de líderes e RHs sobre a falta de preparo dos jovens. Inclusive, uma de nossas clientes, que é Top 5 do setor de Açúcar e Álcool no Brasil, relatou a dificuldade em contratar mão de obra qualificada ao sair dos grandes centros. A fala dele vem somada à de vários líderes (CEO´s ou RH´s) com quem converso frequentemente: “estamos tendo uma escalada de despesas com qualificação de jovens que saem do ensino médio, cursos técnicos e graduação muito despreparados”.
Outras empresas têm relatado que lutam com o desafio de reter e envolver jovens que acreditam que poderão fazer fortuna fácil como influenciadores, o que aprofunda a distância entre esforço + tempo = resultados. Muitos jovens acreditam que com pouco esforço e pouco tempo chegaram lá. Ou seja, isto é um prato cheio para empresas de apostas ou esquemas para ganhar dinheiro rápido.
Jovens que chegam despreparados aumentam o custo de treinamento e integração. Diante dessa situação, é fundamental que repensemos a educação digital que é oferecida aos jovens. O retorno de cursos básicos de informática – popularizados nas décadas de 80 e 90 – pode ser uma solução eficaz para lidar com a falta de qualificação dos jovens. Esses cursos, que outrora foram considerados obsoletos, podem resgatar habilidades essenciais para o ambiente de trabalho atual, tais como a utilização de editores de texto, planilhas e ferramentas de comunicação virtual.
Estudos, como o realizado pela ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial), mostram que apenas 20% dos jovens compreendem que o futuro do emprego está fundamentado em tecnologias de ponta. Isso reflete a realidade de um mercado que esperava receber profissionais minimamente capacitados, mas que, na prática, enfrenta uma força de trabalho carente de habilidades essenciais.
E não são apenas as competências técnicas que estão em falta. O desejo de muitos jovens de obter sucesso fácil como influenciadores digitais cria uma percepção distorcida do que é necessário para construir uma carreira sólida. O esforço e o tempo, fundamentais para a obtenção de resultados, são substituídos por uma visão superficial de sucesso, alimentada por exemplos de quem enriqueceu rapidamente nas redes sociais. O fenômeno contribui para o aumento da rotatividade no mercado de trabalho, pois muitos acreditam que podem abandonar carreiras estáveis em busca de fortunas rápidas – uma mentalidade que se mostra um prato cheio para empresas de apostas ou esquemas que prometem enriquecimento rápido.
O Brasil está diante de um desafio monumental: uma juventude que, apesar de estar hiperconectada, carece das competências digitais básicas exigidas pelo mercado de trabalho. O impacto disso já é sentido nas empresas, que precisam investir mais em treinamento e enfrentam dificuldades para reter profissionais jovens. O retorno de cursos de capacitação digital e o aumento do investimento em educação técnica são fundamentais para garantir que essa geração tenha condições de se inserir no mundo profissional.
Enquanto isso, as empresas precisam estar preparadas para receber esses jovens e proporcionar a eles o treinamento necessário para que possam evoluir e contribuir de forma efetiva. O futuro do mercado de trabalho está intimamente ligado à capacidade de integrar a Geração Z de forma adequada, e isso exige um esforço conjunto entre o sistema educacional, o governo e o setor privado. Só assim poderemos enfrentar essa crise e transformar a realidade da juventude brasileira.
*João Roncati é diretor da People + Strategy, consultoria de estratégia, planejamento e desenvolvimento humano. Mais informações no site http://www.peoplestrategy.com.br/