Iniciarei esse texto com o título do livro de Jette Bonaventure “O que conta o conto?”
Os contos nos apresentam muitas coisas importantes e podem sobreviver por séculos praticamente inalterados, como dizem “os contos vão rolando nas águas do tempo”, revelando aspectos do inconsciente coletivo, ou seja, questões mais básicas e universais de uma coletividade, ou seja, questões que a maioria das pessoas pensa e sente.
Os três pedidos
Destaco aqui o conto dos três pedidos, de Luis da Câmara Cascudo, historiador, folclorista, antropólogo, advogado e jornalista brasileiro, nascido no Rio Grande do Norte (1898-1986).
Resumidamente, nesse conto, “nosso Senhor, visitou um casal pobre e como o receberam e o trataram bem, o Senhor, antes de ir embora disse ao casal: Vocês têm três pedidos que se realizarão imediatamente. A senhora, dona da casa, vendo a pobreza do seu jantar, pensou – quero uma roda de linguiças em cima das brasas -, o marido vendo o que ela pediu, ficou muito bravo e pensou – quero que a linguiça fique na ponta do seu nariz – e a linguiça imediatamente grudou-se ao nariz da esposa, que começou a chorar muito e; também a se lastimar. Com pena da esposa, o marido pediu que a linguiça saísse do nariz da esposa e o resumo dessa história é que os três pedidos não serviram para nada”.
Século XXI
Podemos nos perguntar: “O que esse conto tem a ver com o mundo atual?” Tudo!
Daí podemos ter algumas reflexões importantes a exemplo da importância das escolhas, a mulher faz precipitadamente o seu pedido sem pensar, já o esposo agiu impulsivamente sob forte emoção e sem medir as consequências; e, não obstante esse agir com compaixão face a esposa, eles perderam os três pedidos e a possibilidade de uma existência melhor e mais digna.
Aqui, quero pontuar o primeiro aspecto desse meu escrito, que é a importância de pararmos e refletirmos para compreender o que está por trás das nossas emoções; para a partir daí escolher um pensamento e/ou ação para que determinada situação se encaminhe da melhor maneira possível.
Parar e pensar é muito importante em um mundo em que corremos demais e muitas vezes estamos no piloto automático. Ficar no modus operandi do piloto automático pode gerar muitos problemas e desgastes de todas as ordens, não só no campo relacional.
Efeitos da pandemia
Um dos possíveis efeitos da pandemia da Covid-19 seria uma compensação, no sentido de reequilibrar questões que se desajustaram por conta de um mundo extremamente agitado. Fico pensando, trata-se de uma compensação? Um paradoxo?
Acredito que a pandemia trouxe de tudo. Incluindo transformações em vários cenários a exemplo de um fenômeno que está nascendo e é denominado de YOLO, que na tradução livre significa “você só vive uma vez”.
No livro que escrevi “Biografia de uma pessoa comum”, a ser divulgado, falo muito sobre transição de carreira, o fenômeno YOLO, diz respeito aos jovens repensando a carreira e o estilo de vida durante a pandemia.
Quem nunca pensou largar tudo e mudar o estilo de vida radicalmente? Com o home office, esses questionamentos pessoais e profissionais foram potencializados.
A geração Y, os millennials, nascidos entre o período da década de 80 até o começo dos anos 2000 estão fortemente inseridos no YOLO, esses jovens buscam empreender e ter mais tempo disponível, querem ter uma vida com mais propósito e ter mais tempo para a família e rotina mais flexível. Estão preocupados com a autonomia que terão e o que eles conseguem entregar.
Mudança de sonhos
O sonho de trabalhar em uma grande empresa, estabilidade e benefícios não é mais o alvo de muitas pessoas dessa geração; e certamente de outras também.
As empresas, por sua vez, precisam estar abertas sobre como gerir cada indivíduo de uma forma específica e separada. Segundo minha experiência, trata-se de um superdesafio, em especial para as grandes empresas.
Segundo pesquisa da Microsoft com 31 mil trabalhadores ao redor do mundo mostra que 40% dos trabalhadores estavam pensando em deixar seus empregos ainda 2021. Enquanto isso, nos EUA, mais de 2,5 milhões de pedidos de aberturas de novas empresas foram feitos esse ano. No Brasil, segundo o INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) foram criadas novas marcas. E o número desses registros cresceram 41.9% no período entre julho/20 e junho/21, essa comparação foi feita com o mesmo período anterior.
Mas como digo e repito sempre, para fazer uma transição estruturada e consistente é importante ter organização, planejamento. Em especial o financeiro, apoio, ter um porto seguro, que pode ser um amigo, um mentor, um parceiro, marido, esposa etc.
Fazer transição é possível, desde que feita com base em conhecimento de si e dos nossos limites (autoconhecimento) e da responsabilidade.
O mundo, os comportamentos, o estilo de vida estão todos mudando. Será que isso tem volta?
*por Viviane Gago, facilitadora em Desenvolvimento Humano, mestre em Direito Civil, advogada e autora do livro “Biografia de uma pessoa comum”, que em breve será lançado e conta detalhes da sua transição de carreira. Mais informações em: www.vivianegago.com