Muito se fala em diversidade nas empresas, mas poucos compreendem “matematicamente” os benefícios de uma equipe diversa. Um bom modelo para compreender o tema pode vir da filosofia “geométrica” de Spinoza**. Seu livro mais famoso e revolucionário já antecipa essa preocupação no próprio título “ÉTICA DEMONSTRADA SEGUNDO A ORDEM GEOMÉTRICA”.
E o que a Ética de Spinoza tem a ver com diversidade? Tudo! Um conceito fundamental de sua teoria é o encontro de indivíduos diferentes e como esses encontros afetam cada um dos envolvidos. E não precisam ser humanos. Ele define indivíduo como qualquer coisa (objeto, coisa, pessoa, animal, bactéria), pois seu foco se dá nos encontros. Assim, uma pessoa tropeçar em uma pedra é um indivíduo tropeçando em outro. Um vírus invadindo uma célula também representa a interação de dois indivíduos. Uma gota de chuva molhando uma planta é um indivíduo (água) interagindo com outro (folha da planta).
Para exemplificar, imagine que você vai conhecer pela primeira vez o mar. Chega à praia e vê ondas gigantescas ali e fica com medo. Esse “encontro” com o indivíduo “mar” fica na sua memória como algo ameaçador. Se você nunca mais voltar à praia, para sempre o indivíduo “mar” será uma lembrança ruim. E aí entra a diversidade. Se você não desistir e buscar outras praias, descobrirá que cada uma tem sua característica. Umas são calmas, outras são mais transparentes, outras têm muitos peixes, outras algas e corais.
Spinoza vê como positiva essa organização, essa busca por novos encontros com cada tipo de indivíduo. Ele afirma que “quanto mais um indivíduo é capaz, em comparação com outros, de agir simultaneamente sobre um número maior de coisas, tanto mais sua mente é capaz, em comparação com outras, de perceber, simultaneamente, um número maior de coisas”.
Assim, no exemplo que estamos utilizando, quanto mais encontros diferentes uma pessoa tiver com o mar, mais complexa fica sua memória e conhecimento sobre ele. Até mesmo voltar na mesma praia em horários diferentes traz outras percepções sobre aquele indivíduo. Ficar restrito a encontros iguais (mesma praia, mesmo horário, mesmo dia) reduz a capacidade de análise e a profundidade do conhecimento sobre aquele indivíduo.
E aí que entra a diversidade. Quanto mais diversos e complexos esses encontros, maior é o conhecimento e a geração de ideias novas sobre o tema, mais aprendizados cada um leva dessas interações, maior possibilidade de surgirem insights inovadores.
Voltando ao mundo corporativo, imagine que cada colaborador da empresa é uma “praia”. Se todos os contratados são praias iguais, qual o limite de profundidade das discussões e dos encontros? Como serão geradas ideias inovadoras se todos veem uns aos outros como clones, como praias-padrão?
Uma organização com indivíduos similares (mesma origem social, mesma formação, etnias, experiências de vida, histórico) possui dois grandes problemas: 1) os encontros pouco complexos produzirão as mesmas ideias clichês; 2) e a constante convivência com ideias clichês limitará o desenvolvimento intelectual de cada um. Sem acesso a praias diferentes, os colaboradores manterão o mesmo preconceito sobre o mar. Quando esse simplismo contamina as análises de concorrentes, clientes e produtos, pode ser a gota d’água para a empresa perder mercado.
Aqui vale um último exemplo, mostrando a geometria das interações nos times. Analisando a figura, uma equipe de 5 pessoas possui 10 linhas de interação umas com as outras. Uma equipe de 10 pessoas já possui 45 linhas de interação. Adicione só mais 4 pessoas e as interações dobram! Imagine essa sopa de interações com todos os membros do time sendo similares. E imagine a mesma sopa, mas com cada integrante trazendo experiências, formação, origens diversas. Em qual desses cenários você acredita que haverá maior inovação ou mesmo maior profundidade de análise?
Conclusão: temos a demonstração matemática dos benefícios da diversidade já desde o século 18. Lutar contra esse fato em pleno século 21 não passa de ignorância geométrica. Antes de tudo, existe a escolha moral de buscar maior diversidade nas equipes. Se a escolha moral não for suficiente, esperamos que essa justificativa matemática seja um divisor de águas para você rever o capital humano de sua organização.
*Spinoza é conhecido como o filósofo dos afetos, tendo dissecado dezenas deles (amor, ódio, melancolia, ciúme, soberba, inveja, desejo etc.). Viveu em Amsterdã no séc. XVII, morreu aos 44 anos com uma obra imensa escrita e teve Einstein como seu seguidor mais famoso.
**por Leandro Franz, sócio e consultor da People+Strategy. Mestre em Economia com especialização em Teoria dos Jogos pelo Insper e economista pela UFSC. Mais informações em www.peoplestrategy.com.br