Em tempos de transformação cultural nas empresas, poucos temas têm revelado tanto sobre saúde emocional e liderança quanto o esporte. Em uma das conversas mais instigantes do SXSW 2025, a pesquisadora Brené Brown e o ex-tenista Andy Roddick exploraram o que o tênis e o pickleball podem nos ensinar sobre performance, pertencimento e propósito. E não se trata apenas de esporte, mas de uma metáfora poderosa sobre relações humanas, gestão de times e construção de ambientes saudáveis.
A crescente popularidade do pickleball, especialmente nos EUA não é à toa. Trata-se de uma modalidade que combina movimento, estratégia e conexão humana — características cada vez mais desejadas também nas organizações. Mais inclusivo e de rápida aprendizagem, o pickleball reúne, em quadra, desde executivos de alto nível até iniciantes com histórico de sedentarismo. O ponto de virada? Sua acessibilidade emocional e física, que gera pertencimento imediato e reduz a comparação paralisante.
Processos, não apenas resultados
Na conversa em Austin, Brené enfatizou um ponto essencial: em vez de jogar apenas para vencer, pickleball convida os jogadores a jogarem para aprender. Isso ecoa com força nas empresas. Segundo o relatório global da McKinsey (2023), organizações que valorizam o processo e a aprendizagem contínua em seus times são 29% mais resilientes diante de adversidades e têm rotatividade até 50% menor.
Tanto no tênis quanto no ambiente de trabalho, a diferença entre “jogar para ganhar” e “jogar para não perder” muda completamente a postura. No primeiro caso, há presença, risco, autenticidade. No segundo, há rigidez, defesa e retração. Esse contraste é especialmente visível em times que operam sob pressão sem segurança psicológica — e pode ser revertido com práticas intencionais de desenvolvimento emocional, como feedback estruturado, escuta ativa e a normalização do erro como aprendizado.
Treinar acima do seu nível: o estado de flow social
Brown também citou o fenômeno de “treinar acima da própria média” — aquele momento em que, em parceria, uma dupla de jogadores joga melhor do que jogaria sozinha. Ela chama isso de estado de elevação compartilhada. Em psicologia positiva, é o que Mihaly Csikszentmihalyi chamou de flow: foco intenso, prazer e desempenho alinhados.
Um estudo da Gallup (2022) indica que funcionários que vivenciam esse tipo de experiência em grupo têm duas vezes mais chances de permanecer na empresa por mais de três anos e 48% mais engajamento no dia a dia.
Outras pesquisas recentes em neurociência social indicam que o flow coletivo aumenta a produção de oxitocina, o que potencializa a confiança e reduz a percepção de ameaça entre colegas — tornando equipes mais colaborativas e eficazes (Rock & Ringleb, 2022).
Trazido para a prática, isso pode significar líderes que compartilham vulnerabilidades, metas e aprendizados, em vez de apenas delegar e cobrar. A coragem de errar junto fortalece a coragem de crescer junto.
Adversidade como alicerce da cultura
Outro ponto forte da conversa entre Brown e Roddick foi o papel da adversidade. Brown lembra que normalizar o desconforto é vital — tanto na quadra quanto na liderança. Esconder falhas ou buscar uma zona permanente de conforto prejudica a confiança e esvazia o sentido de pertencimento.
O relatório da Deloitte (2024) mostrou que empresas que incentivam a exposição segura ao erro e ao feedback têm 37% mais inovação incremental e 24% mais confiança interna em processos decisórios.
Estes dados sustentam uma verdade desconfortável, porém necessária: não há crescimento emocional sem incômodo. E a cultura da confiança nasce exatamente da permissão para enfrentar — juntos — o que ainda não está resolvido.
Esportes como o pickleball, que envolvem constante adaptação, erros rápidos e correções em tempo real, são metáforas vivas do que significa liderar com coragem, vulnerabilidade e constância emocional.
Uma oportunidade para líderes
Ao promover atividades físicas como parte da rotina — especialmente aquelas que envolvem jogo, estratégia, leveza e socialização — líderes têm a chance de transformar o clima das suas equipes. A prática pode começar pequena, com encontros semanais, torneios internos ou convites abertos à experimentação.
É também uma maneira de mostrar coerência: quando a liderança se engaja, os times percebem que o discurso de cuidado não é apenas retórico, mas vivido.
Mais do que endomarketing, essas iniciativas alimentam a cultura de pertencimento por meio da vivência — onde o esporte vira símbolo de uma empresa que se move com e para as pessoas.
E poucas coisas conectam tanto quanto estar ao lado do time, na quadra, dividindo aprendizados, derrotas e vitórias.
Talvez o sucesso crescente de esportes como o pickleball esteja nos lembrando disso: que o trabalho pode (e deve) ser um lugar onde corpo, mente e relações importam.
*Lisia Prado é sócia da House of Feelings, primeira escola de sentimentos do mundo. Mais informações no site.

