Filha de pais separados, minha mãe sempre me incentivou a ser independente financeiramente. Ela se esforçava para ampliar minhas perspectivas em relação à escolha profissional, reforçava que eu podia ser o que quisesse e apoiou todas as minhas decisões.
Eu sonhava com uma “carreira de sucesso” – dentro do conceito do que era sucesso para mim àquela época. Também sonhava em ser mãe – a maternidade era uma certeza que eu tinha, fosse com filhos biológicos ou não.
Tive o privilégio de trabalhar em organizações de renome, que me foram de grande aprendizado em diversos sentidos. Em cada uma delas, vivi alguns desafios, mas o maior deles começou quando a maternidade passou a fazer parte da minha vida. Sentimentos de medo e coragem andavam lado a lado, sobrepondo um ao outro em frações de segundos. Um dos motivos do medo era como seria o meu retorno ao trabalho após a licença-maternidade.
E o receio não era sem razão. Uma pesquisa conduzida pela Kennedy School de políticas públicas da Universidade de Harvard, nos EUA, indica que “os empregadores julgam as mães 10% menos competentes do que profissionais que não têm filhos; e as mães são consideradas 12,1% menos comprometidas (enquanto no caso dos pais, este percentual é de 5%).”.
Outra pesquisa, divulgada pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), revela que “a queda no emprego se inicia imediatamente após o período de proteção ao emprego garantido pela licença (quatro meses). Após 24 meses, quase metade das mulheres que tiram licença-maternidade está fora do mercado de trabalho, um padrão que se perpetua inclusive 47 meses após a licença. A maior parte das saídas do mercado de trabalho se dá sem justa causa e por iniciativa do empregador. No entanto, os efeitos são bastante heterogêneos e dependem da educação da mãe: trabalhadoras com maior escolaridade apresentam queda de emprego de 35%, 12 meses após o início da licença, enquanto a queda é de 51% para as mulheres com nível educacional mais baixo”.
Apesar de trabalhar em uma empresa muito aberta à carreira feminina quando decidi engravidar, o caminho foi bem menos fluido do que eu imaginava. Um aborto espontâneo, uma gestação planejada, outra, quase seguida, não planejada (mas recebida com muita alegria) e, no meio do caminho, uma promoção que não aconteceu, tudo isso fez parte de uma montanha russa de emoções.
O nascimento das minhas filhas, somado à morte da minha mãe, fez com que eu passasse a examinar com mais afinco a minha relação com a maternidade, o legado que eu queria deixar e qual caminho profissional teria mais significado para mim.
Esta é uma reflexão que não só passa na minha cabeça, mas de muitas mulheres. Segundo uma pesquisa realizada pelo Movimento Mulher 360, “98% das mulheres dizem que a forma de ver o trabalho mudou depois da chegada dos filhos” e “75% cogitou em algum momento a possibilidade de não voltar para o trabalho após a licença maternidade”, sendo que o medo deste retorno está fincado em atributos como: “confiar que outros cuidem do seu filho, na manutenção do vínculo com seu bebê, na forma como os colegas a receberão, na forma como o gestor lidará com o seu retorno, com a expectativa dela em relação a ela mesma e como serão as tarefas que desempenhará”.
Além dos fatos mencionados anteriormente, toda a experiência que vivi no contexto organizacional durante este período me fez questionar muitos comportamentos que observei e isso alimentou uma vontade de contribuir para relações mais saudáveis dentro das organizações.
O desejo por uma transição de carreira ganhou força dentro de mim. Minha formação era em Engenharia de Produção Mecânica com pós-graduação em Administração de Empresas. Grande parte da minha experiência profissional estava na área de Supply Chain e eu queria fazer uma mudança para trabalhar com desenvolvimento de pessoas.
Este foi outro grande desafio. Uma mudança de carreira dentro da empresa onde eu trabalhava seria bem aceita? Tornar-me autônoma seria possível? O que eu precisaria fazer para viabilizar este desejo? Como isso afetaria o tempo e a relação com a minha família?
Essas e muitas outras questões reverberaram dentro de mim e me deram o impulso para realizar o processo de transição, que teve início com uma jornada de autoconhecimento, além de muito estudo e dedicação para me aprofundar nos temas relacionados à minha área de interesse.
Seguir uma profissão autônoma foi a minha escolha, mas não acredito que este seja o único ou o melhor caminho para conciliar a potência da maternidade com uma carreira de sucesso. Conheço mães que galgaram posições importantes de liderança, mas será esse o caminho do sucesso para todas? A propósito: o que é sucesso para você?
O meu processo de transição de carreira foi árduo e longo, mas valeu a pena. Hoje, sou coach e consultora, especializada em Cultura Organizacional, Desenvolvimento de líderes e Facilitação de grupos. Tenho flexibilidade para estar mais próxima das minhas filhas e posso dizer que me sinto muito realizada pessoal e profissionalmente.
Dentre os diversos papéis que desempenho na vida, há dois que são de suma importância para mim: a maternidade e a carreira. É sobre eles que escrevi no livro “Olhares para os sistemas”, do qual sou coautora juntamente com outras 14 pessoas brilhantes, que será publicado em breve.
*Marina Moreno é mãe, esposa, coach, consultora de Desenvolvimento Humano e Organizacional e agora coautora do livro Olhares para os Sistemas que será lançado em breve nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba.