Daniel chegou ao topo da carreira cedo demais. Antes dos 20 anos a empresa que ele criou era um sucesso e o mundo estava aos seus pés. Independente, o que muitos levam a vida toda para construir – e que tantos não conseguem – o jovem atingiu em dois ou três anos. Dinheiro não era o problema!
A questão é que nada em excesso traz benefícios, ainda mais quando não se tem uma base formada. Para ele a vida não tinha muita graça, faltava a emoção que ele encontrou nas drogas. O gosto do proibido começou com a maconha, evoluindo para a cocaína e LSD, entre tantas outras. Quase com 30 anos sua vida se resumia ao vício em heroína.
Esse exemplo foi retirado de um livro que li recentemente, “Nação dopamina: encontrando equilíbrio na era da indulgência”, da psiquiatra e pesquisadora americana Anna Lembke. E o relato preocupante se torna cada vez mais comum.
A busca por “sentir o coração bater mais forte” está deixando os jovens doentes. A Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE), realizada pelo IBGE com adolescentes entre 13 e 19 anos, relatou o crescimento do consumo de álcool e drogas. Foi de 19% em 2009 para 26,2% em 2019 entre os meninos e de 20,6% para 25,5% entre meninas. A experimentação ou exposição ao uso de drogas aumentou em uma década: de 8,2% em 2009 para 12,1% em 2019 na média entre os dois sexos.
O alerta vermelho também está aceso no quesito saúde mental, principalmente para as meninas. Realizada antes da pandemia, os resultados da PeNSE apuraram que pelo menos 45,5% delas (contra 22,1% deles) tinham a sensação de “ninguém se preocupar consigo”. Mais grave ainda, 33,7% delas (contra 14,1% deles) disseram sentir que a “vida não vale a pena”.
Cerca de 275 milhões de pessoas usaram drogas no mundo em 2021, enquanto mais de 36 milhões sofreram de transtornos associados ao uso de drogas, de acordo com o Relatório Mundial sobre Drogas das Nações Unidas. Dessas, destacam-se a estimulantes (cocaína, crack), depressoras (heroína) e alucinógenas (LSD, ecstasy). Os dados impactam em torno de 5,6% da população de todo o mundo, com idade entre 15 e 64 anos.
“Vício” é uma palavra que há tempos foi normalizada no vocabulário cotidiano: “Sou viciada em café, são no mínimo três ou quatro xícaras por dia”, “Não consigo viver sem refrigerantes, é o meu vício” ou mesmo “É o meu vício sempre olhar as redes sociais, não quero perder nada do que acontece”.
Quem luta contra as drogas geralmente acredita que seus vícios são alimentados por depressão, ansiedade e insônia. Mas o inverso é o que costuma ser verdadeiro: os vícios podem se tornar a causa da dor, e não o alívio dela. Isso porque o comportamento desencadeia, entre outras coisas, uma resposta inicial do neurotransmissor dopamina, que inunda o cérebro de prazer. Mas, uma vez que a dopamina desaparece, a pessoa geralmente se sente pior do que antes, precisando mais do estímulo inicial, e é aí que o vício se inicia.
Os seres humanos são programados para abordar o prazer e evitar a dor. É um instinto que remonta a milhões de anos, a uma época em que as pessoas precisavam procurar comida, roupas e abrigo todos os dias, ou arriscar a morte.
Mas a psiquiatra Anna Lembke diz que, no mundo de hoje, essas necessidades básicas geralmente estão prontamente disponíveis – o que muda a equação. No livro, ela explora a conexão de prazer e dor no cérebro e explica comportamentos viciantes – não apenas para drogas e álcool, mas também comida, sexo e smartphones.
Toda essa comodidade, em conjunto com a proteção dada pelos pais, resulta em uma geração de jovens que não foi preparada para lidar com a dor, a frustração e as dificuldades que a vida impõe.
Não há desafios, tudo é dado, não mais conquistado. A luta e as dificuldades para alguns não existe, eles não passam pelos “desamores”, tão importantes para a nossa construção como pessoas.
A solução, para muitos, é a manipulação das emoções e dos pensamentos. O tempo todo se busca o prazer, a dopamina. Temos uma geração que cada vez mais está viciada em substâncias que dão prazer. E elas são tão fáceis de serem encontradas!
Você já tinha parado para pensar nesse tema? De que maneiras você poderia ajudar quem está à sua volta a se alienar menos e voltar à vida real?
*Por Lisia Prado, sócia da House of Feelings, primeira escola de sentimentos do mundo. Mais informações em: www.houseoffeelings.com